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Henrique Meirelles, Presidente do Banco Central do Brasil na Conferencia Anual do AS/COA em São Paulo

Henrique Meirelles, Presidente do Banco Central do Brasil, fez um pronunciamentio na conferência e anual do Americas Society e Council of the Americas realizada em São Paulo no dia 10 de julho. O presidente exaltou importância do banco em controlar a inflacão neste período de intensa volatilidade global.

Remarks by Brazil's Central Bank
PresidentHenrique Meirelles
at AS/COA's 2008 Latin American
Cities Conference in São Paulo,
on July 10, 2008
***As Prepared for Delivery***
Senhoras e senhores,

Muito obrigado pelo convite para falar mais uma vez em eventos do Conselho das Américas, em um momento tão importante para a economia brasileira e mundial.

O período entre o início da década de 90 e meados de 2007 foi apelidado pelos economistas de “era da grande moderação”, na qual, no que se refere às economias maduras, as oscilações do PIB se reduziram e a inflação parecia permanentemente estabilizada em níveis baixos, graças ao aumento da credibilidade dos bancos centrais, aos avanços da produtividade associados ao progresso da tecnologia da informação e aos efeitos benéficos da globalização. Durante este período havia um elevado grau de consenso de que a emergência econômica da Ásia, notadamente da China e da Índia, contribuiria para manter a inflação mundial sob controle. Graças à incorporação maciça de tecnologia e de mão-de-obra barata ao seu processo produtivo, a China e numa escala menor a Índia exportavam deflação para o resto do mundo por meio de uma queda consistente no preço de suas exportações de bens e serviços. Tudo indica que este ciclo chegou ao final com o aumento do preço das matérias-primas, ditado pelo descompasso entre a expansão de oferta desses produtos e o forte crescimento da demanda. Além disso, já há sinais de aumento do custo da mão-de-obra na China, resultado de mudanças na legislação trabalhista e da crescente limitação da oferta de pessoal qualificado.

No ambiente benigno que vigorou até 2007, os bancos centrais de economias maduras adotaram políticas monetárias neutras ou às vezes expansionistas por períodos prolongados de tempo. Sob tais circunstâncias, o tradicional comportamento pró-cíclico da oferta de crédito se manifestou novamente, contribuindo não para a inflação de preços de bens e serviços, mas sim para a inflação de preços de ativos, notadamente imóveis em certas regiões dos EUA e da Europa.

Os últimos doze meses viram uma substancial mudança nesse cenário: uma grave crise financeira, originada exatamente no setor imobiliário dos EUA, atingiu as economias maduras, ao passo em que, em escala global, a pressão de demanda sobre a disponibilidade de fatores de produção levou à substancial aceleração inflacionária. Os bancos centrais, instituições responsáveis pela estabilidade monetária e financeira global, vivem hoje um ambiente mais complexo e desafiador do que aquele vivido nos anos da chamada “grande moderação”. As respostas das autoridades monetárias têm variado em função da premência dos problemas enfrentados, mas a ênfase na necessidade de preservar a estabilidade de preços continua na ordem do dia.

Inicialmente, os bancos centrais de economias maduras, liderados pelo Federal Reserve, trataram de tomar medidas para, por um lado, conter os danos derivados das dificuldades no mercado imobiliário sobre o sistema bancário e, por outro, limitar o impacto da crise financeira sobre suas economias. Nesse contexto, as políticas monetárias voltaram a adotar um viés expansionista, particularmente agressivo no caso dos EUA, ao mesmo tempo em que novas modalidades de intervenção nos mercados monetários eram introduzidas, de forma a assegurar a convergência entre as taxas curtas de mercado e o instrumento de política monetária.

Mais recentemente, diante da nítida intensificação das pressões inflacionárias e da aparente redução do risco sistêmico - ainda que persistam dúvidas sobre a extensão final das perdas originadas no mercado imobiliário norte-americano - a postura de política monetária nas economias maduras se alterou em direção mais contracionista, exemplificada pela recente elevação da taxa básica de juros na área do Euro.

De fato, seja por conta da elevação dos preços de matérias-primas ou pela pressão de demanda sobre a capacidade produtiva, a inflação se encontra em forte aceleração em todo o globo. Nas economias maduras, que vêm operando com margens mais amplas de ociosidade, a alta dos preços de commodities tem tido papel dominante na aceleração inflacionária. Por outro lado, nas economias emergentes, inclusive o Brasil, pressões de demanda domésticas têm tido papel relativamente mais importante na aceleração inflacionária do que nas economias maduras. Mais especificamente, nas economias emergentes o aquecimento da demanda doméstica criou condições propícias à reverberação de pressões inicialmente isoladas de preços. Não surpreendentemente, na grande maioria dos países emergentes a política monetária tem se voltado para o combate à inflação, por meio de elevações de taxas de juros que objetivam moderar o ritmo de expansão da demanda.

Há hoje entre os bancos centrais razoável grau de consenso de que a economia mundial precisa crescer a taxas mais moderadas. Em outras palavras, há sintomas, como a alta persistente dos preços de diversas commodities, de que a economia mundial encontra-se superaquecida. Sendo assim, cabe às autoridades monetárias nacionais adotar medidas contracionistas, isto é, medidas destinadas a conter as pressões de demanda sobre a capacidade produtiva. A atuação de cada banco central vai evidentemente respeitar as condições econômicas locais, mas a ausência de uma ação coordenada em escala global não pode ser desculpa para atitudes lenientes no front inflacionário em escala nacional. O Banco Central do Brasil, especificamente, não vem esperando nem irá esperar que outros bancos centrais atuem para tomar decisões visando combater as pressões inflacionárias existentes em nossa economia. Não atuar tempestivamente significaria permitir que impactos inicialmente localizados sobre índices de preços levassem a uma deterioração persistente da dinâmica inflacionária, por meio da piora das expectativas dos formadores de preços e salários.

No início deste ano o Banco Central do Brasil sinalizou, em seus documentos oficiais, que os riscos para o cenário inflacionário haviam aumentado, o que poderia requerer uma resposta de política monetária. Esta avaliação surpreendeu muitos analistas, que julgavam que as pressões inflacionárias seriam contra-restadas por um desaquecimento espontâneo da atividade econômica, o que não veio a ocorrer. Outros pareciam acreditar que a elevação dos preços de commodities era passageira e que o Banco Central não deveria agir, e sim esperar que a aceleração inflacionária se materializasse plenamente, para só então atuar. Os fatos mostram que esta atitude de espera complacente teria tido conseqüências deletérias para a economia.

Como repetidamente mencionado nos documentos do Banco Central, o balanço de riscos para a trajetória esperada da inflação tornou-se menos favorável nos últimos meses, tanto do ponto de vista dos fatores externos como, principalmente, dos internos. No âmbito externo, a contribuição das importações para manter um cenário inflacionário benigno tornou-se menos efetiva. No âmbito doméstico, o ritmo acelerado de expansão da demanda continua sendo importante fonte de riscos para a dinâmica inflacionária, diante de sinais de que, a despeito do comportamento robusto do investimento, restrições à expansão da oferta poderiam estar emergindo.Em outra perspectiva, surge o entendimento de que incrementos adicionais na taxa de crescimento da oferta agregada poderiam estar condicionados à continuidade de elevações da taxa de investimento da economia, um processo que reconhecidamente demanda tempo. Nesse contexto, o Banco Central avalia que a redução consistente do descompasso entre o ritmo de ampliação da oferta de bens e serviços e da demanda continua sendo elemento central na avaliação das diferentes possibilidades que se apresentam para a política monetária.

O Banco Central adota uma estratégia de política monetária que procura evitar uma trajetória inflacionária volátil. Tal estratégia leva em conta as defasagens do mecanismo de transmissão, tem se mostrado a mais indicada para lidar com a incerteza inerente ao processo de formulação e implementação da política monetária e terá seus resultados evidenciados ao longo do tempo. Daí se depreende a importância atribuída às projeções de inflação, ao balanço de riscos associado ao cenário prospectivo e, de forma fundamental, à ação preventiva no processo decisório do Comitê de Política Monetária do Banco Central.

Nas atuais circunstâncias domésticas, existe o risco de que os agentes econômicos passem a atribuir maior probabilidade a que elevações da inflação sejam persistentes, o que implicaria redução da eficácia da implementação da política monetária. Assim sendo, a atuação da política monetária tende a ser mais efetiva quando a deterioração da dinâmica inflacionária está em seus estágios iniciais, do que quando se encontra consolidada. Como já disse, cabe à política monetária atuar para que impactos inicialmente localizados sobre os índices de preços não levem, por meio de piora das expectativas, a uma deterioração persistente da dinâmica inflacionária.

As decisões recentes do Comitê de Política Monetária, cuja atuação tem se caracterizado pela tempestividade, se inserem nesse contexto. Seus efeitos sobre a atividade e a inflação, potencializados por certo aperto na liquidez em curso desde os primeiros meses do ano, são cumulativos e serão, sem dúvida, evidenciados ao longo dos próximos trimestres.

A evidência internacional, bem como a experiência brasileira sob o regime de metas, indica que não há vantagens em se conviver por períodos prolongados com taxas de inflação elevadas. Ao contrário, taxas de inflação elevadas levam ao aumento dos prêmios de risco, ao encurtamento dos horizontes de planejamento e conseqüentemente à redução do potencial de crescimento da economia. Sua face mais nefasta é a deterioração da distribuição de renda, uma vez que são as camadas menos favorecidas da população que sofrem proporcionalmente mais o efeito corrosivo da inflação sobre seu poder de compra. Como é evidente hoje mais do que nunca, o combate à inflação gera benefícios indiscutíveis para a diminuição da pobreza e é fundamental para a redução das desigualdades sociais. Assim sendo, o Banco Central já vem atuando e continuará a agir de forma a trazer a inflação de volta ao valor central da meta de 4,5 percent de forma tempestiva, isto é, já em 2009. Tal atitude visa também evitar que se consolide um ambiente de pessimismo inflacionário, no qual a política monetária perderia eficiência.

Que não se espere deste Banco Central uma atitude complacente quanto à inflação. Os formadores de opinião e formadores de preço não devem ter dúvidas quanto à disposição da autoridade monetária de tomar decisões visando promover a convergência da inflação para o centro da meta em 2009. É nossa convicção que esta postura trará, em última instância, os menores custos para a atividade econômica e para a sociedade e contribuirá para consolidar as fundações de uma estrutura econômica sólida, eficiente e eqüitativa.

Muito obrigado por sua atenção!

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